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TCE julga contrato irregular e multa ex-prefeito e ex-secretária de Saúde de Birigui
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Publicado em 18/12/2021

O TCE-SP (Tribunal de Contas do Estado de São Paulo) julgou irregulares a dispensa de licitação e o decorrente contrato da Prefeitura de Birigui com a OSS (Organização Social de Saúde) Irmandade Santa Casa de Birigui e aplicou multa ao ex-prefeito Cristiano Salmeirão e à secretária de Saúde da época, Marian Fátima Nakad.

O contrato para prestação de serviços de atendimento a casos suspeitos de covid-19, urgências e emergências no Pronto-Socorro “Dr. Alceu Lot” foi assinado no dia 22 de abril de 2020, início da pandemia do novo coronavírus, no valor de R$ 975.587,30, pelo período de três meses. A multa estabelecida é de 300 Ufesps (Unidades Fiscais do Estado de São Paulo), o equivalente a R$ 8.727,00 para cada um.

No acórdão, os conselheiros Dimas Ramalho e Renato Martins Costa acompanharam o voto do conselheiro-substituto Samy Wurman e acataram a determinação para que o atual prefeito Leandro Maffeis (PSL) instaure procedimento administrativo a fim de apurar as responsabilidades pelas ilegalidades apontadas pela fiscalização do órgão. Também determinaram o encaminhamento do processo ao Ministério Público Estadual para ciência e eventuais providências, pois o convênio “é objeto de investigação no âmbito criminal nas esferas estadual e federal, por suposto desvio de recursos públicos da área da saúde, no âmbito da operação denominada ‘Raio-X’, deflagrada em 2020”.

Conforme decisão do TCE, foram vários os problemas encontrados, tais como dispensa de licitação, ampliação indevida de serviços já previstos em convênio firmado entre as mesmas partes, inexistência de aumento da demanda por atendimentos, pagamento por serviços e insumos em duplicidade, prejuízos ao erário, não justificativa de necessidade da contratação, não realização de pesquisa de preços, entre outros, descumprindo princípios da legalidade e economicidade.

Contrato

No relatório, o conselheiro do Tribunal destaca, entre outros tópicos, que o contrato previa prestação de serviços para casos suspeitos de covid-19, traumas, infartos e urgências respiratórias que chegariam por meio de resgate ao pronto-socorro, enquanto os atendimentos clínicos de rotina, pediatria e odontológicos, antes realizados no local, seriam deslocados para o “Corujão” (UBS1 – bairro Cidade Jardim), que passou a dar atendimento 24 horas.

No entanto, as justificativas não foram aceitas, pois a fiscalização afirma que os serviços já estavam inclusos no convênio de gestão do PS, “resultando, portanto, em duplo pagamento para o mesmo objeto, sem a devida comprovação do aumento de demanda devido à pandemia, agravado pela clara e severa diminuição da quantidade de atendimentos no pronto-socorro e UBS onde são prestados os serviços”.

Outro problema foi com relação às datas, sendo o início efetivo da prestação dos serviços 15 dias antes da assinatura do contrato, que foi rescindido amigavelmente em 24 de junho do mesmo ano.

Defesa

A Prefeitura explicou ao TCE-SP que havia necessidade de dar atendimento rápido à população e evitar os riscos de contágio, por isso houve separação de “fluxo”, ficando os casos relacionados à covid no PS e os demais, no "Corujão".

Sobre a duplicidade de pagamento, afirma que a comissão de acompanhamento e fiscalização faz, de forma minuciosa, a análise das despesas apresentadas pela entidade social, e somente realiza os repasses relativos ao que foi efetivamente realizado.

Destacou que a OS Santa Casa de Birigui é o único hospital credenciado ao SUS no município, celebra convênios com o Poder Público desde a década de 1990 e que a escolha dela “ocorreu por motivos de conveniência e oportunidade, bem como para privilegiar o interesse público, em face da urgência de se intensificar ações voltadas ao combate e à disseminação do novo coronavírus”.

Sobre o início dos trabalhos antes da assinatura do contrato, atribuiu à necessidade de adoção de providências imediatas para tranquilizar a população, onde já estava instalado “um pânico”.

Indiscutível

Em sua defesa ao TCE-SP, a Santa Casa de Birigui confirmou a adoção de medidas por parte da Secretaria de Saúde para evitar o cruzamento de pacientes "de rotina" com os que apresentavam sintomas do coronavírus e afirmou que é “indiscutível que as medidas adotadas foram justamente para evitar o aumento da demanda relacionada aos casos de coronavírus”.

Informou que a pandemia gerou a diminuição ou o cancelamento de muitos procedimentos médicos, o que prejudicou o equilíbrio orçamentário de muitas entidades privadas que prestam serviços ao SUS, como hospitais filantrópicos e Santas Casas, e citou a publicação de normas com suspensão de metas quantitativas e qualitativas em contratos e regras excepcionais sobre convênios na área da saúde no período.

“O contexto da pandemia e a forma como ela se alastrou, com curvas exponenciais, não permitiria a realização formal de todo um processo que envolveria qualificação, chamamento público, contratação, e, eventualmente, a construção de um hospital de campanha no município”, defendeu.

Calamidade

Salmeirão, por sua vez, disse à fiscalização que optou por firmar um novo contrato com a irmandade devido ao cenário calamitoso que se avizinhava, pois a organização conhece bem a realidade e necessidade local. “É indiscutível que a situação de emergência e de calamidade estavam caracterizadas e que a Prefeitura de Birigui precisava urgentemente disponibilizar amplo acesso ao serviço público de saúde", reforçou.

Também negou duplo pagamento e ressaltou que a dispensa de licitação ocorreu com permissão legal. “Importante destacar, ainda, que a convivência de ambos os contratos não trouxe qualquer prejuízo aos cofres públicos (...) por se tratar de situação emergencial e que demandava imediata atuação, a administração optou por priorizar o início das manobras de atendimento, sem perder de vista os trâmites internos que estavam em vias de serem concluídos”, explicou sobre o início da prestação do serviço antes do contrato.

 
No início da pandemia, UBS 1 (Corujão) passou receber os atendimentos clínicos de rotina, pediatria e odontológicos; segundo TCE, serviços já estavam previstos em convênio anterior (Foto: Divulgação)

Não acatou

Mesmo com todas as considerações, o Ministério Público de Contas e a Secretaria Diretoria-Geral opinaram pela irregularidade.

Em seu voto, o conselheiro destacou que as alegações da defesa são insuficientes para sanar as irregularidades registradas pela fiscalização e citou alguns dados, como a redução superior a 50% na procura por atendimentos no pronto-socorro, nos meses de abril e maio de 2020, possivelmente por consequência direta do isolamento social e da aversão aos riscos de contaminação pelo coronavírus.

“A média mensal de atendimentos realizados no pronto-socorro, que antes ficava em torno de 12.850, foi reduzida para 6.666 em abril e 7.413 em maio de 2020”.

Ainda, de acordo com o relatório, todas as despesas previstas nesse “contrato de ajuste” de atendimentos no PS e nos atendimentos transferidos para o “Corujão” já estavam compreendidas no Plano de Trabalho do Convênio nº 14/2019, firmado entre as mesmas partes em 31/1/2019, pelo valor de R$ 15.180.000,00, para gestão do pronto-socorro e extensão do pronto atendimento básico nas dependências da UBS Cidade Jardim durante todo o ano de 2020.

“Não bastasse, corrobora toda narrativa a respeito da ausência de elementos fáticos para justificar este ajuste, o reconhecimento pela própria municipalidade, em reunião do comitê instalado para o enfrentamento da crise sanitária, ocorrida em 2/6/2020, (quando decorrido pouco mais de um mês da celebração deste ajuste), de que não haveria necessidade da sua manutenção”.

O conselheiro cita ainda algumas despesas majoradas no contrato injustificadamente, especialmente se levada em conta a drástica redução do número de atendimentos dos casos de urgência e emergência odontológicas, pediátricas e clínicas.  

Surpreso

 
"Políticas externas estão atuando para me prejudicar", diz Salmeirão (Foto: Aline Galcino/Hojemais Araçatuba/Arquivo)

Questionado sobre o acórdão, o ex-prefeito Cristiano Salmeirão disse que ficou surpreso com a decisão, uma vez que, no mérito, a mesma diz não ter sido necessária em pleno auge da pandemia a contratação de serviços para atendimento em separado de pacientes acometidos de covid-19 dos demais, informando que tal segregação de pacientes e de fluxo é a orientação do Ministério da Saúde.

Segundo o ex-prefeito, com a implantação do Corujão em 2020, com atendimento 24 horas, foram separadas as pessoas sem covid-19 e que precisavam de atendimento. Aquelas que tinham sintomas passaram a ser atendidas no pronto-socorro, onde foram colocadas tendas. Dessa maneira, conseguiu-se estabilizar a pandemia, infelizmente com a morte de 118 pessoas.

“O atual prefeito invade o pronto-socorro, aumenta em quase R$ 1 milhão mensal o pagamento pelo serviço e até o momento, infelizmente, faleceram mais de 612 pessoas em 2021, ou seja, mais de 400% de mortes no mesmo período, e para o Tribunal de Contas está tudo certo?”, indagou. “Políticas externas estão atuando para me prejudicar, mas a população é testemunha que em 2020 este serviço esteve à disposição e, inclusive, foi fiscalizado por vereadores à época, aprovado pelos conselhos e noticiado pela imprensa”, disse.

Salmeirão esclareceu ainda que a citação da “Operação Raio-X” pelo Tribunal de Contas é abusiva, uma vez que esta não só foi precedente ao contrato, como não tem absolutamente nada a ver com o mesmo.

Por fim, disse que houve um erro grosseiro, uma vez que foram julgados dois processos em conjunto e em um sequer houve a oportunização de defesa a ele, sendo nula a decisão por este motivo e que sua defesa já está elaborando os recursos pertinentes.

Trânsito em julgado

À reportagem do Hojemais Araçatuba, a Prefeitura informou que a Secretaria de Negócios Jurídicos aguarda o trânsito em julgado da decisão para tomar as providências determinadas pelo TCE-SP, e afirma que, no âmbito do município, não há investigações em andamento.

“Investigações e fiscalizações existentes dos contratos da saúde estão correndo no Judiciário (operação Raio-X) e Tribunal de Contas”, explicou. “Por ora, o município tem colaborado enviando documentações requisitadas pelo Tribunal de Contas de todos os contratos que envolvem convênios com a OS Santa Casa de Birigui, firmados na gestão passada”, finaliza.

A reportagem não conseguiu contato com a ex-secretária de Saúde, Marian Fátima Nakad.

Segundo

Esse é o segundo acórdão que julga irregular contrato firmado entre a Prefeitura e a OS Santa Casa de Birigui na pandemia.

Em agosto deste ano, o TCE apontou vários itens ilegais no contrato de R$ 690.803,30 que previa fornecimento de EPIs (Equipamentos de Proteção Individual), insumos e equipamentos aos profissionais que atuavam na urgência e emergência nos casos suspeitos de covid-19. Esse contrato também foi assinado no dia 22 de abril de 2020 e rescindido dois meses depois, em 24 de junho.

  (Leia mais em TCE j ulga irregular contrato de R$ 690 mil para a compra de EPIs)

 

 

 

Aline Galcino - Hojemais Araçatuba
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