Um desabafo de um médico que trabalha como plantonista no pronto-socorro municipal de Birigui (SP) revela a situação crítica em que se encontra a unidade de saúde. Entre ontem e hoje, a Secretaria de Saúde da cidade confirmou as mortes de 14 pacientes que estavam em tratamento no PS e que tiveram o diagnóstico confirmado para a doença.
Segundo o médico, o áudio foi gravado por ele para colegas que fazem parte do grupo de plantonistas no WhatsApp que atuam no local. Porém, as informações foram compartilhadas e chegaram a ser divulgadas na íntegra durante programa jornalístico em uma rádio da cidade no final da manhã desta quarta-feira (31).
No áudio, ele critica a gestão do pronto-socorro pela falta de insumos, argumentando que comprou por conta própria medicamentos para ministrar em pacientes, enquanto a unidade de saúde oferece “guaraná” para ser distribuído aos pacientes.
Sem alimentação
Comentou ainda que há pacientes com sonda nasoenteral, mas que não recebem dieta, ou seja, acabam ficando desidratados e sem alimentação.
“Não alimenta o cara, não hidrata o cara. Está tudo morrendo de insuficiência renal, de TEP (tromboembolismo ou embolia pulmonar), de bloqueio de ramo (alteração no padrão normal do eletrocardiograma), de hiperpotassemia, de hipopotassemia, de hipercalemia. É o fim”, declarou.
O médico comentou que o pronto-socorro de Birigui chegou a ser considerado modelo em outras ocasiões e hoje os profissionais trabalham “em condições de escravidão” , sem respaldo algum por parte da administração municipal.
Ele disse que é um dos médicos que está há mais tempo atuando como plantonista na unidade e segue trabalhando para minimizar o sofrimento dos pacientes, mas argumentou que não há muito o que ser feito diante da falta de insumos, medicamentos e de pessoal.
Por fim, argumentou que é feita a cobrança por parte dos médicos e a resposta recebida é que estão providenciando a compra dos materiais, que nunca é efetivada.
“Eu não estou querendo fazer intriga, estou sendo sincero. Eu vou lá praticamente todo dia. Você fica vendo pessoas morrendo o dia inteiro, paciente morrendo, louco para fazer uma medicação para tentar reverter o quadro ou modificar o quadro, mas não tem condições, não tem como fazer nada”, revelou.
O médico finaliza comentando que estão morrendo pessoas de pouca idade, não por estar com quadro clínico tão comprometido, mas porque estariam “sendo abandonadas” para morrer, pois não tem condições de tratar.
“Eu falo porque eu dou o sangue naquele pronto-socorro, então o mínimo de direito que eu tenho é de falar o que estou passando lá e o que estou vendo lá. É quase que o grito de desespero, pois ver aquilo lá é lamentável, muito lamentável”, finaliza o áudio.
A reportagem conversou com o médico, que explicou que o que ele fez foi comentar com os colegas a situação real do pronto-socorro de Birigui, pois foi a forma que encontrou para pedir ajuda.
“É triste essas coisas. Eu estou realmente muito chateado com tudo que está acontecendo no mundo e principalmente aqui na nossa região. Chega a ser desesperador de estar passando por este cenário”, comentou.
Pronto-socorro de Birigui reflete realidade da região e País, segundo a Prefeitura
Questionada sobre as declarações do médico plantonista do pronto-socorro, a Prefeitura de Birigui argumentou que a situação da unidade de saúde não é diferente da realidade da região e do País, que está com o sistema colapsado por conta da segunda onda da pandemia da covid-19.
“Hospitais públicos e privados estão sobrecarregados, sem leitos de UTI (Unidade de Terapia Intensiva), com dificuldades para compra de medicamentos e insumos por falta no mercado, conforme noticiado diariamente pela imprensa”, informa em nota.
A administração municipal listou algumas medidas adotadas para melhorar, a cada dia, os atendimentos no pronto-socorro municipal:
1 – Reestruturação da farmácia, visando não deixar faltar medicamentos necessários.
2 – Ampliação do sistema de gás de oxigênio, triplicando a capacidade do oxigênio usado pelos pacientes;
3 – Reformulação da equipe médica, diante da saída, por decisão própria, de alguns médicos;
4 – Alimentação equilibrada para pacientes covid fornecida pela Santa Casa;
5 - Compra de 5 respiradores. Agora a unidade possui 8 respiradores;
6 – Compra de bombas de infusão (aguardando entrega do fornecedor);
7 – Implantação dos atendimentos de fisioterapia respiratória com o objetivo de auxiliar na recuperação dos pacientes para que deixem de fazer uso de oxigênio;
8 – Credenciamento junto ao Governo do Estado para abertura de 18 novos leitos de enfermaria no pronto-socorro;
9 – Em processo de abertura do Pronto Atendimento Básico para atendimentos clínicos, com o objetivo de desafogar o pronto-socorro que hoje é considerado um mini-hospital para atendimentos covid e emergências;
10 – Implantação de atendimentos com assistentes sociais.
Médicos
Com relação à saída de alguns médicos do plantão, a Prefeitura informa que ela se deu por decisão própria dos profissionais e que eles não faziam parte da equipe que atendia casos de covid-19.
“Com a saída deles, a Secretaria Municipal de Saúde precisou fazer uma reestruturação médica por meio da empresa contratada para prestar o serviço. Hoje o pronto-socorro conta com médicos plantonistas, diretor clínico, responsável técnico e coordenador médico”, explica.
A Prefeitura argumenta que os atuais médicos plantonistas são profissionais excelentes, com qualificação adequada e preparados para atender os casos clínicos de covid-19 e emergências.
"Médicos e equipes de enfermagem estão esgotados, mas trabalhando com dedicação para salvar vidas. A administração municipal reforça ainda que ao contrário do que foi divulgado, os medicamentos para intubação e outros necessários para os atendimentos não estão em falta no momento”, afirma em nota.
Ainda de acordo com a Prefeitura, os pacientes em isolamento na ala Covid recebem refeição equilibrada fornecida pela Santa Casa, enquanto os lanches, refrigerantes e frutas são doados por voluntários para o projeto “Mãos que Cuidam” , destinados exclusivamente para pacientes e acompanhantes dos atendimentos clínicos.
A nota termina informando que mesmo diante de todas as dificuldades enfrentadas por conta da pandemia, a administração municipal, por meio da Secretaria Municipal de Saúde, não tem medido esforços para oferecer aos pacientes do pronto-socorro municipal um atendimento digno, principalmente aos que necessitam de transferência para UTIs e aguardam liberação de leitos indicados pela Central de Regulação da Secretaria de Estado da Saúde.
“O prefeito Leandro Maffeis (PSF) tem acompanhando diariamente in loco a situação da unidade, pois o foco da atual administração é a saúde e, diante da situação crítica da pandemia, em salvar vidas”, finaliza a nota.
Lázaro Jr. - Hojeais Araçatuba